De "A vida é Bela"... Olhos que fazem baixar os meus. Um riso que se perde em sua boca. Ai está o retrato sem retoque do homem a quem eu pertenço. Quando ele me toma em seus braços, ele me fala baixinho. Vejo a vida cor-de-rosa ... (São todas as budegueras que encontro passeando pelo Google que acho lindo, como: poemas, músicas, vídeos, crônicas, reflexões, minhas reflexões...
SEGUIDORES - ONDE VOCÊ ESTIVER... AI ESTÁ MEU CORAÇÃO!
Chega de violência contra a mulher!
quarta-feira, 21 de julho de 2010
Desejo - te
terça-feira, 20 de julho de 2010
Balada do Cárcere de Reading

Escrito na prisão de Reading, quando cumpria a pena de dois anos de prisão, com trabalhos forçados, condenado que fora pelo crime de cometer atos imorais com diversos rapazes, em plena era da hipócrita moralidade vitoriana, na Inglaterra, nos idos de 1890. A inspiração da Balada foi a agonia de um companheiro de prisão, sargento Charles Woolridge, durante o interregno de sua condenação até seu enforcamento, em 7 de julho de 1896. O sargento fora sentenciado pelo assassinato de sua mulher, a golpe de punhal.
Amor, ódio, violência, angústia, sofrimento, imoralidade, cinismo, heresia, fé, prepotência, poder, loucura se misturam em desatino e levam, sem distinção do grau de culpabilidade, à condição sub-humana , irracional e destruidora da vida física e espiritual, num contexto atemporal.
Balada do Cárcere de Reading
Ele despira a túnica vermelha;
mas sangue púrpuro, encarnado,
sangue e vinho das mãos lhe gotejavam,
quando o viram, alucinado,
junto do leito dela, - o seu amor,
seu pobre amor apunhalado.
Ia andando entre os mais, e era cinzento
o traje velho que vestia.
Usava um gorro às listas, e o seu passo
ligeiro e alegre parecia.
Porém eu nunca vi homem que olhasse,
tão anelante, a luz do dia.
Jamais, jamais vi homem contemplar,
com tão profundo sentimento,
essa breve, essa estreita faixa azul
que os presos chamam firmamento:
e as nuvens brancas, velas cor de prata,
vogando no ar, flutuando ao vento!
Eu, com outras almas angustiadas, ia
andando em pátio separado,
a cismar qual o crime, grande ou leve,
por que o teriam condenado,
- quando alguém sussurrou atrás de mim:
"vão pendurar esse coitado!"
Jesus! as próprias grades da prisão
rodam, de súbito, em delírio!
Pesa o céu sobre mim, qual elmo de aço
que o Sol inflama, - ardente círio!
E a minha alma, de mágoas trespassada,
esquece, olvida o seu martírio.
Eu soube, então, a idéia lacerante
que o atormenta, e o faz correr,
e o faz olhar, tristonho, o céu radiante,
radiante, e alheio ao seu sofrer:
ele matou aquela que adorava,
- por causa disso vai morrer.
No entanto (ouvi!) cada um mata o que adora:
o seu amor, o seu ideal.
Alguns com uma palavra de lisonja,
outros com um frio olhar brutal.
O covarde assassina dando um beijo,
O bravo mata com um punhal.
Uns matam o Amor velhos; outros, jovens;
(quando o amor finda, ou o amor começa);
matam-no alguns com a mão do Ouro,
e alguns com a mão da Carne, - a mão possessa!
E os mais bondosos, esses apunhalam,
- que a morte, assim, vem mais depressa.
Uns vendem, outros compram; uns amam pouco,
noutros, o Amor dura de mais;
uns enterram-no aos ais, vertendo pranto,
outros sem prantos e sem ais:
todo o homem mata o Amor; porém, nem sempre,
nem sempre as sortes são iguais.
Nem sempre ele padece morte infame,
por um dia trágico e baço,
o capuz na cabeça, e na garganta
a corda fria, o horrendo laço;
nem fica a balançar, do alto de um poste,
- soltos os pés e as mãos no espaço.
Nem vai sentar-se entre homens silenciosos.
que estão imóveis, de vigia,
ou procure rezar; ou chore, triste,
em amaríssima agonia:
a sua vida é presa da prisão,
- ah, não a roube ele algum dia!
Nem vê, ao despertar, sombras estranhas
cruzando a sua úmida cela:
o Capelão, de branco e vacilante,
mais o Xerife, atroz, que o vela;
e o Diretor, de luto, como a Sorte,
- a face pálida, amarela.
Nem tem de erguer-se arrebatadamente,
vestir as roupas da prisão,
enquanto algum doutor, boçal, lhe espia
a mais ligeira contorção,
- com o tique-taque hostil do seu relógio
a martelar-lhe o coração:
Nem vai sentir, fogosa, na garganta,
uma secura imitigável,
antes que o Algoz, Soturno, abrindo a porta,
- hirto, enluvado, inexorável, -
o ate com três correias, pra que nunca
sofra mais sede, o insaciável!
Nem tem de ouvir, curvado, o Ofício Fúnebre,
Ofício Fúnebre de morto;
nem, pensando que ainda não morreu,
contemplará, transido, absorto,
o seu próprio caixão, entrando, lento,
no seu antro de Desconforto.
Nem, por teto de vidro, enxergará,
do dia, a luz tênue e fugaz;
nem a Deus rogará, com lábios secos,
breve agonia, - o Sono, a Paz;
nem sentirá, na sua face trêmula,
o beijo torpe de Caifaz.
II
Seis semanas inteiras ele andou
com a veste usada que trazia.
Tinha um gorro de listas, e o seu passo
ligeiro e alegre parecia;
porém eu nunca vi homem que olhasse,
tão anelante, a luz do dia.
Jamais, jamais vi homem contemplar,
com tão profundo sentimento,
essa breve, essa estreita faixa azul
que os presos chamam firmamento;
e as nuvens esgarçadas no horizonte,
- flocos de espuma errando ao vento!
Não retorcia as mãos, - tal como alguns
de idéia curta, e alma louçã,
que ousam crer, mesmo em negro Desespero,
numa Quimera estulta e vã:
ele fitava, calmo, a luz da aurora
sorvendo o ar puro da manhã.
Não retorcia as mãos e não chorava,
nem lamentava o seu inferno;
ia, apenas, bebendo o ar como um bálsamo,
bálsamo bom, bálsamo eterno...
Abria os lábios e bebia o Sol
como uma taça de falerno.
E eu, e todos os mais, - nós que penávamos
num outro pátio separado,
esquecemos de pronto as nossas faltas,
a nossa Sorte, o nosso Fado,
para seguir, com olhar de assombro, esse homem
que ia, entre nós, ser enforcado!
E era estranho que o víssemos andando,
- tão leve e alegre parecia...
E era estranho que o víssemos fitando,
tão anelante, a luz do dia.
E era estranho lembrar que ele, a sua dívida,
de tal maneira a pagaria.
Tem lindas folhas o álamo e o carvalho,
que em maio brotam viridentes:
mas é medonha a forca, - arvore negra,
raiz mordida de serpentes:
e verde ou seca, morre o condenado
sem lhe avistar frutos pendentes.
É para o céu, para o azulado empíreo,
que o anseio humano se alevanta!
Mas quem, do alto da forca, atado a um laço,
com a corda presa na garganta,
ergue seu turvo olhar ao firmamento
quando o carrasco se adianta?
Dançar, ao som de um violino, enleva,
se a Vida é bela e é belo o Amor;
dançar, ao som de flautas e alaúdes,
é raro, fino, embalador...
Mas é horrível, no ar, com os pés ligeiros,
dançar, num último estertor!
Curiosamente, mudos, consternados,
o vigiávamos dia a dia,
pensando que talvez nosso destino
igual ao dele acabaria:
pois ninguém sabe pra que rubro inferno
sua alma, cega, se transvia.
Por fim, deixei de vê-lo entre os mais presos,
sempre sozinho, vagamundo...
Soube então que o levaram; que jazia
em negro cárcere profundo,
e que eu, jamais, de novo o enxergaria,
neste belo, divino mundo...
Dois navios perdidos que se cruzam
em ruim paragem tormentosa,
- nós nos cruzamos, mudos, sem um gesto,
numa atitude silenciosa:
pois de dia nos vimos (não de noite)
e a luz é casta, é vergonhosa.
Muros de uma prisão nos circundavam,
éramos réus por nossos danos.
Deus e o seu mundo, inexoravelmente,
nos repeliram desumanos;
e a sinistra armadilha do Pecado
nos seduziu com seus enganos.
III
É um forte, o pátio dos Endividados:
muralhas frias, pedra dura.
Lá passeava ele no ar, sob o céu plúmbeo,
entre dois guardas da clausura,
temerosos que o preso lhes morresse
de qualquer morte prematura.
Ou sentava-se entre esses que à sua dor
sempre ficavam de vigia,
quer de joelhos, rezasse, quer se erguesse
para chorar sua agonia;
- não fosse ele roubar-lhes uma vida
que só à força pertencia.
O Diretor timbrava em executar
a letra do Regulamento;
para o Doutor, a morte era, em ciência,
um banal acontecimento;
- duas vezes por dia o Capelão
deixava um opúsculo ao detento...
Duas vezes por dia ele fumava
o cachimbo, e bebia um trago.
Sentia a alma valente, e sem lugar
para o pavor, o medo aziago:
e dizia esperar, ânimo alegre,
do Carrasco o sinistro afago.
Mas nenhum guarda nunca perguntou
a razão desse estranho gosto...
Os Guardas da Cadeia! Quem por sorte,
quem por sorte ocupe esse posto,
deve trazer nos lábios um cadeado
e andar de máscara no rosto.
Pois de outra forma se comoveria,
tentaria uma frase amena...
Mas no "Antro de Homicidas", que diria
da Caridade a voz serena?
Que palavra de alívio ela traria
a uma alma irmã, nessa geena?
Cadenciados, marchando em volta ao pátio,
nós somos loucos em parada!
Que importa? Bem sabemos que Satã
é o general desta Brigada.
Lenta, arrastando os pés, cabelo curto,
lá vem a alegre mascarada!
Desfiamos cordas alcatroadas, rijas,
- unhas gastas, dedos sangrentos;
esfregamos o chão, limpamos portas,
e metais claros, espelhentos;
e enxaguamos, aos turnos, o assoalhado,
batendo baldes barulhentos.
Cosemos sacos e quebramos pedras,
furamos tábuas com uma pua.
Tinem marmitas; cantos se misturam;
gira o moinho, e a gente sua...
Mas dentro da nossa alma, um terror mudo,
um terror grande se insinua.
Por isso os dias correm lentos, como
vagas, rolando com sargaços!
E nós nos esquecemos do Destino,
que os homens vis prende em seus laços,
- quando, ao vir do trabalho, um dia, vemos
uma cova, ante os nossos passos.
Boca amarela e rude, ela bradava
por uma vitima; e, feroz,
a terra hostil pedia sangue ao pátio,
- pedia sangue, em alta voz!
Ah! logo vimos que ao romper da aurora
iria à forca um dentre nós.
Recolhemo-nos todos, a alma atenta
à Morte, à Sorte, e ao Medo infando.
O Algoz passou com o seu pequeno saco,
na treva os passos arrastando:
e cada qual, na tumba numerada,
se enfiou, trêmulo e cismando.
Nos longos corredores, essa noite,
a Sombra e o Medo erraram juntos;
pelo Antro Férreo, passos se sentiam,
sem som, furtivos, desconjuntos...
E por fora das grades, espiavam
faces macabras de defuntos.
E ele dormia calmo, como quem
dorme em abril, numa clareira.
Os que, de noite, o sono lhe vigiavam,
não sabiam de que maneira
podia alguém dormir, tão sossegado,
tendo o Carrasco à cabeceira.
Não há, porém, repouso, quando choram
os que nunca verteram pranto!
Assim, nós, criminosos, nós velamos,
(noite sem fim, de Horror e Espanto!)
e a angústia alheia, - a Dor No-la estendeu
por sobre as almas, como um manto.
Ai! do Pecado de outrem, como é dura,
como é terrível a expiação!
Ai! com o gládio do Mal, envenenado,
varando o nosso coração,
- que lágrimas de fogo não choramos
pelo crime daquele irmão!
Com sapatos de feltro, às nossas portas
passavam, mudos, os rondantes;
e viam, surpreendidos, pelas frestas,
formas humanas, vacilantes:
e estranhavam por que é que erguiam preces,
esses que nunca oraram dantes!
Loucos, velando um morto, nós rezamos,
ajoelhados, fitando o céu.
A escuridão da noite, parecia
de uma eça negra o negro véu.
E era esponja embebida em vinho amargo,
o Remorso de cada réu.
Cantaram galos, rubros e cinzentos,
sem que rompesse o dia após...
Tortuosas formas tétricas, nas celas,
nos transiam de horror atroz:
e os espíritos maus da noite-morta,
riam, pulando em frente a nós.
E rápidos giravam, deslizavam,
como viandantes na neblina.
Imitavam a Lua, contorcendo-se
em pose grácil, feminina:
e, passos nobres, elegância odiosa,
chegavam outros, em surdina.
Alegres, trejeitando, e de mãos dadas,
entram, de súbito, em ciranda!
Rodopiam fantasmas em delírio,
numa grotesca sarabanda;
e, caricatos, fazem arabescos,
como o vento na areia branda!
Com piruetas gentis de marionetes,
leves, levíssimos bailavam!
Era estridente a música do Medo
com que o seu baile acompanhavam:
e, para despertar na cova os mortos,
alto, bem alto, eles cantavam:
"Oh! - diziam - o mundo é largo. A viagem
para os trôpegos, enfadonha!
Jogar os dados uma ou duas vezes,
é de bom-tom, gente bisonha!
Mas, ai! perde quem joga com o Pecado,
na oculta Casa da Vergonha."
Não eram sombras vás, esses fantoches,
volteando em doida alacridade!
Para nós, - vidas presas na Prisão,
pés tolhidos, sem liberdade,
eram, - Senhor do Céu! - entes bem vivos
e de execranda fealdade!
Sempre ao redor, valsavam contorcendo-se:
alguns, giravam com seus pares;
outros subiam, ágeis, as escadas,
em atitudes singulares...
E outros arremedavam nossas preces,
rindo, a zombar, fazendo esgares.
Gemia o vento da manhã, lá fora,
mas a noite, sem arrebol,
em seu tear gigante inda tecia,
da treva, o fúnebre lençol!
E nós, a orar, sofríamos, temendo
a Justiça clara do Sol.
Gemia o vento em volta das muralhas
do úmido cárcere infernal;
e o Tempo, enfim, moveu-se, - como roda
de aço, a girar no vendaval.
Ó vento soluçante! que fizemos,
para te ter por senescal?
Por fim, a sombra amarga da janela,
ferros cruzados em xadrez, -
ante o meu catre, na parede branca,
foi surgindo, com timidez...
Vi que a aurora de Deus, rubra de sangue,
rompera, algures, outra vez.
Varremos, às seis horas, nossos quartos;
e às sete, como em pesadelo,
um bater de asas, forte, encheu os ares,
passou, num trágico arrepelo.
Era o Senhor da Morte que chegava,
com frio hálito de gelo.
E não chegou, pomposo, em corcel branco,
manto de rei, de arminho e penas.
Bastam à forca uns metros, só, de esparto,
e uma tábua, das mais pequenas...
Para o trabalho oculto, o Arauto veio
com a corda da Desonra apenas.
Éramos como quem, num brejo escuro,
a tatear, trêmulo avança.
Nem já tínhamos ânimo de orar,
nem de entrever paz e bonança!
Morrera dentro em nós alguma coisa:
morrera, em nós, nossa Esperança.
A Justiça dos Homens, firmemente,
segue na sua arremetida:
implacável, severa, vai levando,
o forte e o fraco de vencida:
- com calcanhar de ferro esmaga o forte,
a monstruosa parricida!
O toque das oito horas aguardamos,
cheios de sede, - ardor aflito!
pois o toque das oito é o do Destino
com que nasceu o homem maldito;
e o Destino usa sempre a mesma corda,
para o justo e para o précito.
Só tínhamos, sentados, que esperar
por esse toque ameaçador...
Pedras soltas, num vale abandonado,
era sem fim nosso torpor:
mas, agitado, o coração batia,
como um demente num tambor!
Súbito, na Prisão, bate o relógio,
e o som, pelo ar, vibra espantoso!
E um gemido de dor, de desespero,
ecoa, lúgubre, estrondoso,
- qual o grito que lança, num pau,
a boca negra de um leproso!
Como quem, no cristal claro de um sonho,
vê uma tragédia apavorante,
assim vimos a corda gordurosa
balançar, no poste infamante;
e ouvimos a oração, que o nó do Algoz
cortou, num grito lancinante.
Eu compreendi, melhor do que ninguém,
aquele grito amargo e forte,
e o seu remorso, e o seu suor de sangue,
e a angústia, o horror da sua sorte!
- Pois o que vive mais do que uma vida,
deve morrer mais que uma morte.
IV
Não há ofício, no dia em que na forca
um preso cumpre a sua sina:
ou sente, o Capelão, pálida a face,
ou grande dor d'alma o domina;
ou, coisas que ninguém deve saber,
inda lhe bailam na retina.
Meio dia era já, quando vibrou
do sino o toque funerário!
A cada qual, espiando, os guardas abrem
a cela, - e em passo tumultuário,
vamos descendo a férrea escada, livres
do nosso inferno sedentário.
Fomos andando ao ar suave de Deus,
mas, como dantes, ninguém ia;
- pois, faces brancas uns, outros cinzentas,
o medo nelas transluzia!
E eu nunca vi ninguém olhar assim,
ansiosamente, a luz do dia.
Eu nunca vi ninguém olhar assim,
com tão profundo sentimento,
essa breve, essa estreita faixa azul
que os presos chamam firmamento.
E as nuvens, sem cuidado, ao longe, no ar,
felizes, livres como o vento!
Mas, entre nós, havia uns que marchavam
cabisbaixos, alma aflitiva,
sabendo bem que a forca mereciam,
pois sua falta era excessiva:
mataram uma coisa morta, e o outro,
- apenas uma coisa viva.
O que peca segunda vez acorda,
para a Dor, uma alma dormente:
tira-a do seu sudário maculado,
e a faz sangrar sangue vivente;
e a faz sangrar, num jorro largo e forte,
e a faz sangrar inutilmente.
Quais monos e truões, vestes listadas,
bizarramente, uma por uma,
seguimos, silenciosos, dando a volta
ao pátio escuro, envolto em bruma;
seguimos, silenciosos, dando a volta,
e ninguém disse coisa alguma.
Seguimos, silenciosos, dando a volta,
e à nossa mente, oca, vazia,
a memória fatal de coisas fúnebres,
um vento fúnebre a trazia:
e o Horror nos enfrentava a cada passo,
e o Terror bárbaro, o seguia.
Passam guardas de um lado para o outro,
vigiando, espiando a horda de brutos,
Seus uniformes novos, de domingo,
brilham, asseados, impolutos:
mas a cal dos sapatos denuncia
o que fizeram há minutos.
Pois onde a cova tinha sido aberta,
não se notava a menor falha:
só uma faixa de terra e areia fofa,
junto da horrenda muralha;
e um punhado de cal, da que serviu
ao pobre morto, de mortalha.
Ai! mortalha de cal, abrasadora,
bem pouca gente é que a reclama!
Sob um pátio de cárcere (e despido,
para mais triste e negra fama!)
ele dorme, com os pés acorrentados,
envolto num lençol de chama.
E por tempo sem conta a cal roerá
a carne e os ossos desse irmão:
de noite os ossos duros, e de dia,
a carne mole, em consumpção:
comerá turno a turno a carne e os ossos,
mas, sem cessar, o coração!
Três longos anos, nada irão plantar
nesse local de desventura!
Maldito ficará três longos anos,
maninho estéril de secura!
E olhará, com assombro, o céu distante,
amargamente e sem censura.
Pensam que o coração de quem matou,
tisna a semente dadivosa.
Não! A Terra de Deus é acolhedora,
e, mais que o homem, generosa:
mais rubra floriria a rosa rubra
e mais de neve a nívea rosa!
Brotar-lhe-ia uma rosa cor de sangue
da boca! E, branca, outra do peito!
Quem sabe? Tem Jesus estranhas vias,
e é estranho, às vezes, seu conceito:
- fez, outrora, ante um Papa, abrir-se em flores
seco bordão de um Seu eleito.
Mas nem rosas vermelhas, nem de neve,
podem florir nestes terrenos.
Só nos dão cacos, sílex e pedras;
só nos dão mágoas e venenos...
A flor abranda o Desespero aos simples,
- e é crime, aqui, sofrer de menos.
Ah! jamais rosas brancas ou vermelhas
pétala a pétala cairão sobre essa lama em que ele dorme, unido
ao muro hediondo da Prisão,
- pra lembrar que Jesus morreu por todos,
a nós, e aos outros que virão!
Contudo, embora a tétrica muralha
o envolva, o cinja em férreo abraço,
e um espírito de pés acorrentados
não possa, à noite, errar no espaço,
mas só chorar, chorar, nessa ímpia terra,
morto de mágoa e de cansaço,
Ele dorme em sossego, - o malfeliz!
ou dormirá, dentro de pouco!
Não mais, vendo o Terror em pleno dia,
sofre, e receia ficar louco.
Não mais! a Negra Pátria em que repousa,
não tem, nem sol, nem luar tampouco!
Enforcaram-no, assim como a uma fera!
Nenhum sino dobrou na igreja,
que ao seu transido espírito trouxesse
uma paz doce, benfazeja:
mas depressa o esconderam numa cova,
onde a parede mais negreja.
Despiram-no. Em seguida o abandonaram,
e com sarcástico sorriso,
fitaram-lhe a garganta, inflada e púrpura,
o olhar imóvel, indeciso...
E envolveram-no, após, numa mortalha,
brutos, torcendo-se de riso.
Jamais o Capelão se ajoelharia
na sua campa, que traduz
a Desonra, e jamais nela poria
a triste bênção de uma Cruz,
- visto ele haver pecado, e ser dos míseros
por quem veio morrer Jesus.
Enfim, tudo acabou. Do Reino Escuro
ele transpôs o limiar.
A urna da Piedade, urna partida,
há de, por ele, transbordar!
Por ele chorarão todos os réprobos,
esses que sempre hão de chorar.
V
Não sei se as Leis são justas ou se injustas.
Os pobres presos miseráveis
só sabem que as muralhas da prisão
são altas, fortes, invioláveis;
e que um dia é mais longo do que um ano,
- ano de dias infindáveis.
Mas sei que as Leis, que o Homem, para o homem
fez, com seu ânimo iracundo,
desde o primeiro que matou o irmão,
e deu início à Dor do mundo,
são peneiras que guardam joio vil
e atiram fora o grão fecundo.
E sei também (assim todos soubessem!)
que as paredes de uma Prisão
são feitas com tijolos de ignomínia
e têm grades negras, que são
para Cristo não ver como o Homem trata
barbaramente o seu irmão.
Grades que a lua amável desfiguram,
e o sol, de raios triunfais!
É melhor, sim! que escondam esse inferno:
pois lá se passam coisas tais,
que nem Filho de Deus nem filho de Homem
as deveria olhar jamais.
Como planta daninha, o ato mais vil
floresce bem, no ar da cadeia.
Só o que é bom no homem lá se perde,
só o que é mau lá se granjeia.
Há dentro um guarda: o Desespero; e à porta,
a Angústia fica de alcatéia.
Matam de fome as tímidas crianças,
até que chorem noite e dia;
azorragam os fracos e os dementes,
maltratam velhos à porfia.
Uns enlouquecem; todos se pervertem,
- mas ninguém diz sua agonia.
Cada célula estreita é uma latrina
escura, fétida, nojenta!
Um hálito mortal, fecalizante,
enche a lucarna pardacenta.
Tudo morre; a Luxúria, apenas, vive
e a Humana Máquina atormenta.
A água suja e salobra que bebemos,
lodo e imundície traz consigo.
O pão amargo e escasso, que nos dão,
tem cal e gesso mais que trigo.
E o Sono, sem dormir, pede, em desvairo,
que o Tempo abrande o seu castigo.
Embora em nós a Fome e a Sede lutem,
como serpentes em refrega,
ninguém cuida em sustento. O que nos mata
é, quando desce a noite cega,
sentir cada um, no coração, as pedras
que o dia inteiro ele carrega.
Com meia-noite dentro d'alma, e a cela
num crepúsculo funerário,
damos à manivela e esfiamos cordas
em nosso inferno sedentário.
E o silêncio apavora, mais que o bronze
a redobrar num campanário.
Nunca uma voz amiga vem falar-nos,
meiga, num gesto humano e puro:
o olhar que nos vigia, no postigo,
é impiedoso, áspero e duro:
apodrecemos, - alma e corpo em ruínas,
esquecidos neste monturo.
Arrastando os grilhões férreos da Vida,
vamos, sozinhos, degradados:
um se maldiz; o outro chora; - e seguem
em silêncio, os mais desgraçados;
mas a Divina Lei suaviza e parte
os corações dos condenados.
E cada um que se parte, na Prisão,
é como aquela ânfora cheia
que outrora se partiu, e o seu tesouro
deu a Jesus da Galiléia,
espargindo na casa do Leproso
o olor do nardo da Judéia.
Feliz esse que parte o coração
e ganha a Paz, e ganha o Amor!
Quem, de outra forma, pode libertar-se
do Pecado escravizador?
E onde, a não ser num coração partido,
entra Jesus, Nosso Senhor?
Ah! o morto de garganta inflada e púrpura,
e olhar imóvel, indeciso,
aguarda as santas mãos, que o Bom Ladrão
exaltaram ao Paraíso:
Deus não despreza os corações contritos,
e é estranho, às vezes, seu juízo.
O homem da lei, vestido de vermelho.
deu-lhe, de vida, três semanas,
para a sua alma conciliar consigo,
e sem idéias ruins, tiranas,
purificar do sangue derramado,
as mãos, um dia desumanas.
E ele purificou, chorando sangue,
as rudes mãos de instintos crus:
pois só o sangue lava o próprio sangue
e só o pranto ao Bem reconduz:
e a nódoa rubra de Caim transforma
na branca auréola de Jesus!
VI
No cárcere de Reading, junto a um muro,
terra de opróbrio os ossos come
de um desgraçado, envolto num sudário
que o afogueia e que o consome!
É uma campa infamante essa em que jaz,
uma campa que não tem nome!
E aí, até Jesus chamar os mortos,
tranqüilamente há de jazer.
Inútil verter lágrimas inúteis,
e dar suspiros, e gemer.
- Ele matou aquilo que adorava,
teve, por isso, de morrer.
No entanto (ouvi!) cada um mata o que adora:
o seu amor, o seu ideal.
Alguns com uma palavra de lisonja,
outros com um frio olhar brutal.
o covarde assassina dando um beijo,
o bravo mata com um punhal
Oscar Wilde
Algumas de suas citações célebres...
"Egoísmo não é viver como queremos, egoísmo é querer que os outros vivam como queremos que eles vivam.
"A única maneira de livrar-se de uma tentação, é render-se a ela."
"Sempre perdoe seus inimigos - nada irrita tanto. "
"Você realmente acha que é fraqueza que cede à tentação?Digo-te que há terríveis tentações, que exige força, força e coragem para ceder."
"Eu sou a única pessoa no mundo que gostaria de conhecer completamente. "
"Considero o teatro como a maior de todas as formas de arte, a forma mais imediata em que um ser humano pode compartilhar com outro o sentido do que é ser um ser humano. " "Eu vejo quando os homens amam as mulheres. Dão-lhes apenas um pouco de suas vidas. Mas as mulheres que amam dão tudo."
"Manter o amor em seu coração. Uma vida sem ele é como um jardim sem sol, quando as flores estão mortas. " "Há muitas coisas que jogaríamos fora, caso não tivessemos medo que outros pudessem pegá-las"
"Sociedade existe, unicamente, como um conceito mental; no mundo real, existem apenas indivíduos"
Oscar Wilde